Vida

No dia 4 de Agosto de 1904 nasceu na cidade de Braga, uma criança do sexo feminino com o nome de Maria Felizmina.

A mãe de Maria Felizmina morreu quando esta tinha quatro anos. O pai casou em segundas núpcias e foi morar para outra casa. A criança idolatrava a ama e quando deixou de estar com ela ficou doente. O pai entregou-a novamente à ama que era uma lavradeira em Lomar onde cresceu com os ares lavados do campo e o aconchego de um lar que não era o seu.

Com poucos anos, Maria Felizmina teve uma visão ou sonho do bom Jesus do Monte que lhe perguntou:

-Queres ir para o céu?

-Quero ir para a tia.

-Sofrerás muito em toda a tua vida.

Aos seis anos, Maria aprendeu a doutrina e aos sete anos confessou-se a primeira vez ao reverendo padre António Maria Fernandes e ao padre João de Azevedo. Comungou a primeira vez aos dez anos, porque naquele tempo não era permitido a primeira comunhão aos sete anos.

Maria Felismina ao mesmo tempo que estudava, era sumamente piedosa. Consagrou a Nossa Senhora do Sameiro especial devoção e comungava com frequência. Sempre se notou nela uma piedade espontânea, simples e sincera.

Maria Felizmina desejava ser filha de Maria. era obstáculo a sua pouca idade de quinze anos.

Um dia em conversa como o Padre Luiz Gomes:

"Senhor Padre Luiz Gomes eu desejo ser Filha de Maria."

"És ainda muito nova. Não podes entrar"

"Ó Senhor Padre, só a mim é que me não deixam entrar!"(e começou a chorar)

"Sossega, filha, que hás-de entrar!"

Decorrido pouco tempo era admitida para aspirante e depois para Filha de Maria, aos quinze anos, abrindo-se uma excepção, quanto à idade, para ela! Maria Felizmina consagrava apreço às associações religiosas, filiando-se pela vida fora em muitas, desde o Apostulado da Oração cuja patente de admissão data de 14 de Junho de 1917, até à Associação dos Amigos do Bom Jesus do Monte cujo diploma lhe foi passado em 10 de Janeiro de 1953.

Maria Felizmina cursou os estudos com aproveitamento, distinguindo-se entre as condiscípulas pela inteligência, boa educação e disciplina.

Num caderno de memórias, escreveu " Adoeci gravemente pela primeira vez em 1924 - tinha 20 anos com uma peritonite gravíssima, ficando 13 anos doente. Ao fim sofri uma melindrosíssima operação, ficando boa 3 anos".

Maria Felizmina curou-se completamente da impertinente enfermidade que a reteve no leito por vários anos. Atribuiu a sua cura a Nossa Senhora do Sameiro e publicamente dirigiu-lhe um agradecimento.

Um dia de convalescença viu Nossa Senhora sob uma forma mais bela que a imagem do Sameiro. A Virgem era deslumbrante e formosíssima...
Maria Felizmina levava vida inocentíssima. A 3 de Julho de 1937, aos 33 anos fez a sua primeira confissão geral no Hospital da Póvoa de Lanhoso, quando foi operada pela primeira vez. Não precisava de fazer uma confissão geral, contudo quis preparar-se. No seu testamento de de 1 de Outubro de 1955 escreveu." Maria Felizmina agradece ao Sagrado Coração de Jesus e a Nossa Senhora do Sameiro por ter vivido sempre na Sua Divina Graça desde que nasceu aos 4 de Agosto de 1904"
Em 20 de Agosto de 1937, no Hospital já ia melhor e já podia caminhar.

Havia um problema difícil a resolver. A tia de Maria Felizmina, D. Maria da Conceição muito sofrera. Quando válida, fizera um testamento ou carta de consciência em que deixava à sobrinha mil escudos e um capital ou bens imóveis que rendessem 300$00 mensais, em dinheiro de 1936 e 1937. O testamento foi sonegado. Nunca o mostraram a Maria o que demonstra má fé. Se era uma carta de consciência valia à face da moral, e criava uma obrigação de consciência.

O tio Ernesto de Maria Felizmina mal aconselhado, com o falecimento da esposa, começou a desprezar a sobrinha. O sr. Ernesto impôs à sobrinha que saísse de casa! começava a recusar cumprir obrigações legais e familiares que assumira, de velar pela sobrinha doente!

D. Maria Felizmina contava 33 anos. Tomou à pressa alguma roupa e abalou. Não sabia para onde ir. à porta das tias não bateria porque só a esperariam desgostos. Havia de ser mendiga depois de ser senhora?
Recordou-se de ter visto num jornal um anúncio:
" Lar académico recebe meninas e professoras."

Para poder pagar a sua mensalidade começou a leccionar em particular piano, bordados e pintura. Muitas lições eram gratuitas e de outras não recebia a remuneração porque se esqueciam de pagar. Foi nomeada regente do Posto Escolar de Gondar, em Guimarães, em 28-09-1939. Em 20 de Março 1940 era transferida para o posto escolar de Fradelos, na freguesia de Tadim, concelho de Braga.

D. Maria Felizmina esgotou-se de trabalho diurno e nocturno. Tantos ensaios de música, tantas aulas, tantos esforços e tão fraca alimentação- pois tirava o alimento da boca para o dar aos necessitados -  conduziram a um estado geral de esgotamento, um organismo já enfraquecido. As forças faltavam-lhe e a doença prostrou-a no leito. Alimentava-se mal. Tinha que pagar o aluguer da casa e da escola. Foi sempre muito cuidadosa em pagar as dívidas. Preferia não comer a dever!
Em casa não tinha criada nem alguém que cuidasse dela. Estava só, e sem dinheiro. Rezava e pedia ao Coração de Jesus e a Nossa Senhora do Sameiro que lhe valesse em tão difícil circunstâncias. E a pobreza extrema e o abandono a rondar-lhe a porta!
À hora fixa as crianças da escola iam servir-lhe o leite à cama. Todos os meninos queriam essa honra. Ela dizia " então era servida pelos anjos!"
Um dia tudo faltava na casa de Fradelos. A doente esgotara os seus últimos centavos. Apetecia-lhe um caldinho de cenouras. Remexia e revirava o porta-moedas. Não tinha nada. De repente, sem saber como apareceu-lhe cinco tostões na mão! Manda comprar as cenouras e come o caldinho!
Ninguém a ajudava ou socorria. Não podendo pagar, não comprava nada. não conhecia ninguém que lhe pudesse emprestar dinheiro. A população do lugar compunha-se na sua maioria de jornaleiros e carregadores. Como poderiam ajudá-la?

Um sacerdote foi visitá-la e achou tão mal que aconselhou o seu internamento no Hospital de Braga.
Fizeram-lhe imediatamente uma operação quase  sangue frio por não poder suportar anestesiantes, a qual durou 3  horas. Sofreu horrivelmente.
Ano e meio esteve no Hospital. Vinham os passarinhos poisar-lhe na cama e as pombas entravam também a visitá-la.
Passou o Natal de 1943 no Hospital de S. Marcos.



Depois foi para a casa do Arco da Porta Nova, que pessoas caritativas puseram à sua disposição.O espaço de que dispunha era exíguo. Ali viveu a sua vida de  imolação e teve consciência de que o Coração de Jesus a tinha escolhido para vítima e para sofrer pela Paz no mundo, pela conversão dos pecadores e em desagravo a Deus, Nosso Senhor.

O povo começa a descobrir que algo sobrenatural existe naquela mulher que se resigna a sofrer e leva uma existência de santidade e sacrifício.

REGULAMENTO DE TODOS OS DIAS
Dia 1º de Novembro de 1943

Orações da manhã. Comunhão e Oração. Várias intenções. Diante de Jesus Sacramentado. Visita a Jesus Sacramentado. Atos de adoração e reparação a Jesus Sacramentado. Terço do Santíssimo Sacramento. Colóquio ao Santíssimo Sacramento. Quinze minutos diante de Jesus Sacramentado. Jaculatórias em honra do Santíssimo Sacramento. Semana Santificada. Aos pés de Jesus Crucificado. Convenção com Nosso Senhor. Exercícios das cinco chagas. Coroa em honra do preciosíssimo Sangue de Jesus. Aspirações a Jesus Crucificado. Via-Sacra 2. Terço 3. Ao S.S. de Jesus 13. Pelos pecadores 3. Pelas almas 30. Pela Paz 3. Terços à Divina Providência 3. Orações da noite.



Como professora doente que adoeceu no seu posto, dirigiu um pedido para conseguir uma pequena reforma. Não lhe sendo reconhecido o direito a esta, nada obteve do Estado.

No seu leito de doente levava uma vida de intensa piedade. Foi sempre assim. Vivia toda para o CORAÇÃO DE JESUS, piedosa e orante. Da cama com um pauzinho puxava a correspondência que lhe deixavam debaixo da porta. Só num dia recebeu quarenta cartas, fora as que lhe trouxe o correio! suplicavam-lhe orações para todas as espécies de calamidades. Nos dias em que guardava silêncio, escrevia o que era necessário em bilhetes breves.

Muita gente ía à sua casa: sacerdotes, freiras, senhoras piedosas, cavalheiros, pobres,ricos, velhos, crianças. Também frequentava a sua casa o Rev. Padre José Peixoto que já então gozava de grande popularidade e tinha fama de santo.

Um dia a Irmãzinha teve o desejo de açúcar branco. O açúcar da lata era amarelo enegrecido. Olhou o Coração de Jesus e pediu açúcar branco! À noite abriu a lata e o açúcar apareceu branco! a Irmãzinha começou a chorar por esta delicadeza do Sagrado Coração de Jesus!

A irmãzinha consagrava, por dia, 7 a 8 horas à oração contemplativa. Nesta altura a sua alma achava-se num estado de oração mística extraordinária. Por isso não tolerava já a oração vocal a não ser fora da meditação.Só nos últimos anos conseguiu receber Nosso Senhor todos os dias desde 1958 a 1961. Por vezes, depois de comungar ficava com uma expressão transfigurada, cheia de beleza sobrenatural, com o rosto cor de rosa, e de adolescente. Aparentava 15 ou 18 anos. Aconteceu de o sacerdote ter de esperar alguns instantes antes de lhe dar a sagrada comunhão, por naquela altura a Partícula Sagrada se lhe transformar no Coração de Jesus visível.


Mandava distribuir esmolas e ficava muitas vezes sem dinheiro em casa. Queria viver do dia a dia, na pobreza e no abandono ao Coração de Jesus. Um dia a Irmãzinha deu o dinheiro da renda para obras de caridade. passados dias viu o Coração de Jesus que olhava para ela do meu do quarto, sem lhe dizer nada. Decorridos 3 dias uma pessoa entregue-lhe dinheiro. Tirou o necessário para a renda e desfez-se do resto em obras de misericórdia.

No tesouro Espiritual oferecido pelos paroquianos da Sé Primaz de Braga, a Sua Santidade o Papa Pio XII na canonização de S. João de Brito apresentou estas flores espirituais:

" Missas ..............................Ofereço as de todo o mundo
Comunhões .........................53
Sacríficios ...........................1060
Terços ..................................2968
Esmolas ...............................535
Boas Obras...........................795
Jaculatórias ..........................26 500

Braga, Junho de 1947"


Sofreu muito na casa da Rua das Boavista. Disse um dia:" Para aliviar os meus sofrimentos ponho-me a cantar baixinho, mas as lágrimas saltam-me pelas faces!"

No meio do seu martírio ainda pensava nos outros! Enquanto dispôs de algumas forças tomou banho em água regelada que, de propósito deixava na banheira durante a noite para mais arrefecer. Sofria pelo Coração de Jesus! Um dia o coração tremia-lhe mas não desistiu de tomar o seu banho em água regelada para sofrer e para converter pecadores!

Na fé, na esperança, na caridade na pureza, na piedade, na paciência deixava iluminar a sua alma com carismas sobrenaturais que lhe grangearam entre o povo, o título merecido de santa.

Na humildade distingui-se em não falar de si. Se lhe beijavam as mãos, ou tocavam nela objetos de piedade, confundia-se e olhava imediatamente para a imagem do Coração de Jesus, a pedir humildade.

Um grande desgosto foi a ruina da Obra do Padre Oliveiros. Quis entrar em clausura, suspirou por ela e nunca o senhor Cónego Dr. António Ribeiro lhe solucionou o problema. O prudente sacerdote julgava-a incapaz de entrar num convento, dada a débil saúde.

Tantos anos de doença sofridos com vontade sincera e contínua de santidade, com fidelidade às 7 ou 8 horas de oração mental diárias, com dedicação à glória do Coração de Jesus, demonstram virtudes heróicas.

Um disse " Vê ali no chão aquelas laranjas? estava com vontade de absorver o sumo de todas pois estou a arder em sede. Mas venço-me. Por amor de Jesus, não tomo nenhuma."

Em 15 de Março de 1960, às 19 horas acendeu a luz do quarto. Os canários começaram a canta, disse " Estão a cantar, por causa da minha partida para Jesus. Estão contentes!".

Os canários muitas vezes mortificavam-na. No dia 14 de Março de 1960 disse:"Os canários de noite fazem-me sofrer. Ofereço tudo a Jesus. Custa-me ouvi-los cantar no estado de fraqueza em que me encontro."
Na meia noite de 15 de Março de 1960 para 16 esteve em agonia durante uma hora. Não chamou ninguém senão de manhã, às 6 horas, para não perturbar o sono das duas pessoas que a acompanhavam. Sobreviveu a muitas crises de morte e agonia. Sem explicação aceitável da ciência, vencia-as e continuava a viver. Nos dias 20 a 25 de Fevereiro de 1960 sofreu uma crise de morte. A Irmãzinha só repetia: " Quero ir para o céu, quanto antes!", não quis sequer que lhe chamassem o médico.






A irmã gostava imenso de rosas e açucenas, mas no fim da vida não podia já suportar os seus perfumes.






O sentimento de gratidão a Deus e ao próximo era nela profundíssimo e ardente. Desfazia-se em agradecimentos aos sacerdotes que lhe levavam nosso senhor. Certo dia a Irmã estava muito aflita por ver que o sacerdote tinha trazido a Santa Comunhão e uma das pessoas da casa se descuidara em acender as velas. De repente vê descer do céu, fogo muito brilhante sobre o relicário e contempla a Sagrada Hóstia envolta em luz! (3 de Maio de 1960)

Uma senhora viu várias vezes o quarto da Irmãzinha todo iluminado com um fulgor celestial muito diferente do fogo da terra. O esplendor só durava uns instantes. Uma outra senhora contou facto idêntico , ocorrido noutra ocasião.


A Irmã Maria Estrela Divina detestava a publicidade.Reservava os domingos para receber pessoas de Braga, às segundas-feiras para as pessoas da diocese e as terças-feiras para as pessoas de fora. Só recebia da parte de tarde. Ás quartas-feiras recebia o confessor, o médico e algum sacerdote conhecido. Durante o Advento e a Quaresma as visitas ficavam suspensas. O seu desejo era de não receber ninguém. Queria que a deixassem só para pensar em Deus e orar. Suspirava pela clausura das religiosas de vida contemplativa. No entanto, a irmã aproveitava a ocasião para falar do Coração de Jesus e dar os seus conselhos de vida cristã. Falava com simplicidade. Por vezes enternecia-se com tanta desgraça e começava a chorar com as pessoas. Vinham cancerosos, cegos, tuberculosos e enfermos com doenças monstruosas pedir-lhe que suplicasse ao Coração de Jesus, a sua cura. Ela rezava com os doentes e mandava celebrar celebrar Missas ao Coração Divino por estes infelizes.
Muitos obtinham a saúde e vinham agradecer. Outros não se lembravam de voltar, procedendo como os nove leprosos de Jericó.


Essas aglomerações de pessoas que pediam entrada, nada lhe deixavam. Só algumas pessoas amigas a socorriam. Da casa da Rua da Boavista, a irmã banira toda a publicidade e todo o comercialismo. Nada se vendia nem sequer estampas.


A irmã fundou a Obra do Sagrado Coração de Jesus, para promover o desagravo, a reparação e converter os pecadores. Em vida não se desenvolveu , apesar das quantias que entregou ao senhor cónego, seu confessor. Sofria em ver paralisada a Obra apesar dos desejos do Coração de Jesus e dos seus. Padecia em silêncio. Antes de morrer confiou a causa à bondade do padre Dr. Ambrósio de Pina, S. J. que lhe levava a comunhão todos os dias.

continua....